Eu me lembro de uma noite, quando eu era um moleque, devia ter uns 14 pra 15 anos, talvez um pouco menos. Já era tarde e eu tinha ficado acordado sozinho na sala do antigo apartamento da minha família pra assistir a algum filme. Não lembro qual era o filme, mas me recordo que tinha algo a ver com o mar e que ele deixou uma sensação em mim quando a história acabou, algo de positivo e encorajador, do tipo "vá lá e faça você mesmo", "seja alguém, agarre o seu destino".
Eu era só um moleque e aquilo me fez tão bem, conectou os meus botões e me deixou com vontade de ser alguém.
O filme tinha acabado e eu fui até a janela gradeada, ajoelhei na poltrona que ficava bem abaixo dela, debrucei sobre o vão de alumínio, nostálgico de algo que eu ainda não tinha vivenciado. Lembro que olhei pra cima e vi um monte de estrelas e, secretamente, desejei que um dia eu percorresse uma jornada tão fantástica quanto à do personagem principal daquele filme.
Eu cresci e a vida foi me lançando suas investidas, ondas suaves batendo na pedra, até finalmente começar a moldá-la. Eu percebi que a jornada daquele personagem do filme pop que me impressionara tanto na época não é nada comparada ao que acontece com gente de carne e osso, gente que não tem o charme de um James Franco e que não fala palavras que foram escritas por Oliver Stone.
Enfim, as ondas continuaram a bater e me afetaram tanto! Me transformaram num homem! Logo eu, que ainda sinto calafrios quando tenho que falar em público e que ainda hesito milhares de vezes antes de me aproximar de uma mulher. Logo eu que, assistindo àquele filme, olhei pro céu e desejei estar naquele mesmo mar, achando que as espumas das ondas tinham gosto de baunilha. Não têm. São águas salgadas e têm gosto de lágrimas.
Mas num dia desses, como outro qualquer, saindo do trabalho, parei numa padaria pra forrar o estômago.
"Meia de café com leite e um maço de Luckys, por favor!" - Se naquele filme o mar parecia ter água doce e os cigarros, um gosto vazio de fumaça, no mundo em que eu vivo, a água é lágrima e os cigarros têm um gosto de conforto.
Enquanto bebia e fumava, me peguei olhando pro céu de novo. Me dei conta de que lá estavam as mesmas estrelas, me encarando de volta.
Fechei os olhos e desejei.
5 comentários:
Maravilhoso o texto!
Estou feliz que tenha voltado a postar. =D
Muito bom!
Por mais que possamos nos sentir desiludidos, não deixamos de sonhar..Até mesmo tomando um café na padaria, até mesmo sentindo a água como lágrimas, aquele moleque sonhador instiga, lembra que existe, volta à tona..
Gostei muito de seu blog.
Parabéns pelo blog! Estou seguindo para acompanhar as novidades!
Gostei deste seu escrito. É um conto fictício ou real? De qualquer forma, você leva jeito para a coisa e nos transporta para seu mundo, de cigarro, lágrimas e sonhos antigos que aparentemente, mesmo com a rotina, parecem nunca morrer. Ainda bem.
http://escritoslisergicos.blogspot.com
Olá, Alexandre, obrigada pela visita, estarei sempre por aqui também!
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